
APP TOPO DE MORRO – Garopaba
- maio 17th, 2023
- colpocarvalho
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UMA DAS MAIORES CONTROVÉRSIAS TÉCNICO/JURÍDICAS DO DIREITO AMBIENTAL
As Áreas de Preservação Permanente (APPs) foram criadas pelo Código Florestal de 1965, e representaram importante instrumento disciplinador das atividades florestais, entre outras normas instituídas por esse código. O debate entre as forças políticas, durante a revisão do código, provocou mudanças nos parâmetros de delimitação das APPs no Código Florestal sancionado em 2012, que resultaram em novo arranjo espacial das áreas protegidas no Brasil.
No ano de 2014, ou seja, logo após as alterações acima mencionadas na legislação me deparei do ponto de vista profissional com processos de fiscalização na cidade de Garopaba, Estado de Santa Catarina, onde tive a oportunidade de visualizar as primeiras intepretações dos pontos de vista técnico e jurídico dos órgãos ambientais e do Mistério Público.
Diante deste envolvimento direto nestes casos, foi possível verificar a evolução da interpretação da legislação por estes entes públicos, bem como a discrepância entre os métodos de aplicação dos parâmetros estabelecidos pelo Código Florestal de 2012.
Um caso emblemático, refere-se ao local denominado “Morro do Capão” que trata-se de um relevo, considerado por alguns, como serra isolada em meio à planície costeira na baia de Garopaba, Estado de Santa Catarina, abrangendo desde a praia da Vigia, passando pela praia do Silveira e, terminando, na praia da Ferrugem.
O referido caso teve inicio através de um inquérito civil aberto em 2014 pelo Ministério Público Estadual, onde tive a oportunidade de acompanhar os trabalhos iniciais. Referido trabalho, que iniciou para apurar a suposta construção irregular de uma residência, ao longo dos anos, evoluiu para um estudo técnico que identificou uma duvidosa área de preservação permanente de 321 hectares, com 217 edificações e 92 feições antrópicas, entre residências e empreendimentos de fins econômicos.
Tal caso, ao meu ver, se torna mais emblemático, ao passo que grande parcela deste território identificado encontra-se dentro da APA da Baleia Franca (unidade de conservação regulada pelo ICMBIO).
No decorrer destes anos, pude verificar um verdadeiro descompasso entre todos os entes públicos que participaram dos trabalhos, tornando evidente a fragilidade da legislação ambiental protetiva. Não houve consenso técnico/jurídico entre os órgãos, ou seja, houve grande divergência quanto a intepretação da legislação e a metodológica para sua aplicação.
Nessa linha, identificamos diversas metodologias distintas para aplicação da denominada APP TOPO DE MORRO, inclusive, em perícias ambientais realizadas em processos no mesmo local em comento.
O Ministério Publico Estadual, através de seu Centro Operacional Técnico, foi evoluindo os estudos diante da sua intenção de tornar conclusiva sua tese quanto a existência da área de preservação. Foram realizados diversos pareceres técnicos de complementação, onde, inclusive, foi realizado a identificação das áreas de risco alto e muito alto.
Nesse imbróglio, para nossa surpresa, muitas dessas áreas, contam com empreendimentos que passaram pelo rigoroso crivo de licenciamento ambiental do Estado de Santa Catarina, gerando a seguinte pergunta: Ora, como é possível tamanha divergência entre órgãos do mesmo Estado?
Além disso, como visto, a área possui ocupação urbana autorizada pelo Município, que inclusive, declarou no Plano Diretor como área urbanizável sem nenhum tipo de restrição quanto ao topo dos morros.
As maiores divergências relacionadas ao tema, de alta complexidade no direito ambiental, estão relacionadas a interpretação técnica do tipo de relevo (ondulado ou não ondulado), bem como ao conceito e método de aferição do que diz a lei: “inclinação média maior de 25°”.
Assim, as grandes controvérsias neste tema estão diretamente relacionadas a obrigação (ou não) de que a média superior a 25° seja calculada entre o topo e a obrigação (ou não) de mensurar a declividade de toda a elevação.
Segundo especialistas, a dificuldade deriva na imprecisão da legislação quanto aos métodos aceitos nas classes de relevos do território nacional. Ou seja, a lei limita-se a exigir que a elevação esteja acompanhada de inclinação média superior a 25°, sem estabelecer como, onde ou quantas vezes medir.
De qualquer forma, a solução para controvérsia está longe do fim, a questão está judicializada e, certamente, será um grande desafio para a justiça decifrar o melhor caminho para resguardar o meio ambiente em questão em paralelo aos direitos fundamentais das pessoas que ocuparam de forma licita a região, equacionando, assim, o direito constitucional ao meio ambiente equilibrado com os princípios da dignidade da pessoa humana, direito a moradia, razoabilidade e proporcionalidade.
Nessa grande confusão, uma coisa é certa, estaremos acompanhando de perto o desenvolvimento dos trabalhos no sentido de mitigar os efeitos da insegurança jurídica gerada pela complexidade deste tema tão relevante no direito ambiental. Se você gosta do tema, fico à disposição para trocar ideias: eduardo@colpocarvalho.com.br